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terça-feira, 3 de agosto de 2010

Vida em Cristo - Prova Viva

de Max Lucado

- Jenna, acorde, está na hora de ir à escola.

Ela ouvirá essas palavras milhares de vezes na vida. Mas ouviu-as pela primeira vez esta manhã.

Sentei-me na beira de sua cama algum tempo antes de dizê-las. Para falar a verdade, não queria dizê-las. Não queria acordá-la. Uma estranha hesitação pairava sobre mim ao sentar-me ali na escuridão da madrugada. Envolto pelo silêncio, percebi que minhas palavras a despertariam para um novo mundo.

Por quatro anos-relâmpagos ela havia sido nossa, e apenas nossa. E agora tudo isso ia mudar.

Colocamo-la na cama ontem à noite como "nossa menina" - propriedade exclusiva de mamãe e papai. Mamãe e papai liam para ela, ensinavam-na, ouviam-na. Mas a partir de hoje, alguém mais também o faria.

Até hoje, eram mamãe e papai que limpavam as lágrimas e faziam os curativos. Mas a partir de hoje, alguém mais também o faria.

Eu não queria despertá-la.

Até hoje, sua vida era essencialmente nós - mamãe, papai e a irmãzinha caçula Andrea. Hoje essa vida se ampliaria novos amigos, uma professora. Seu mundo era esta casa o quarto, os brinquedos, o balanço. Hoje seu mundo se expandi-ria. Ela adentraria os átrios sinuosos da educação - pintar, ler, calcular. . .crescer.

Eu não queria despertá-la. Não por causa da escola. E uma boa escola. Não porque não desejo que ela aprenda. Deus sabe que desejo que ela cresça, leia, amadureça. Não porque ela não deseje ir. Ela não tem falado noutra coisa além da escola nesta última semana!

Não, não queria acordá-la porque não queria entregá-la.

Mas acordei-a mesmo assim. Interrompi sua infância com a proclamação inevitável:

- Jenna, acorde... está na hora de ir à escola.

Levei a vida toda para me vestir. Denalyn me viu amuado por ali e ouviu-me cantarolando "Sunrise, Sunset" (Aurora, Ocaso) e disse:

- Você nunca agüentará o casamento dela.

Ela tem razão.

Levamo-la à escola em dois carros para que eu pudesse dirigir-me diretamente ao serviço. Convidei Jenna para ir comigo. Achei que ela precisaria de um pouquinho de afirmação paterna. Conforme ficou patente, era eu quem precisava de afirmação.

Para alguém dedicado à arte das palavras, encontrei muito poucas para dizer à minha filha. Disse-lhe que se divertisse. Disse-lhe que obedecesse a professora. Disse-lhe:

- Se se sentir sozinha ou amedrontada, diga à sua professora para me chamar e virei buscá-la.

- Está bom - sorriu ela. Então pediu-me se podia ouvir uma fita de músicas infantis.

- Tudo bem - falei.

Assim, enquanto ela entoava canções, eu me esforçava para não chorar. Observei-a enquanto ela cantava. Parecia crescida. O pescocinho se espichava tão alto quanto podia para olhar por cima do painel. Os olhos estavam famintos e brilhantes. As mãos estavam cruzadas no colo. Os pés, calçando novíssimos tênis rosa e turquesa, mal se estendiam além do assento.

É esta a menininha que carreguei?
E esta a criancinha que brincava?
Não me lembro de ter ficado mais velho.Quando foi que fiquei assim?
Quando ela passou a ser tão linda?
Quando passei a ser tão alto?
Não era ontem mesmo que eram os pequeninos?
Aurora, ocaso; aurora, ocaso;
Tão depressa voam os dias. 1

- Denalyn tinha razão - resmunguei comigo mesmo - nunca agüentarei o casamento dela.

Em que ela está pensando? conjeturei. Será que sabe como é alta esta escada da educação que começará a subir agora?

Não, ela não sabia. Mas eu sabia. Quantos quadros-negros esses olhos verão? Quantos livros essas mãos segurarão? Quantos professores esses pés seguirão e - engulo em seco - imitarão?

Se estivesse em meu poder, teria, naquele exato momento, reunido todas as centenas de professores, instrutores, treina-dores e tutores que ela teria durante os próximos dezoito anos e anunciaria:

- Ela não é uma aluna comum. É a minha filha. Cuidado com ela!

Quando estacionei e desliguei o motor, minha menina crescida tornou-se pequenina outra vez. E foi a voz de uma menina muito pequenininha que quebrou o silêncio.

- Paizinho, não quero sair.

Fitei-a. Os olhos que haviam estado a brilhar agora refletiam medo. Os lábios que haviam estado a cantar agora tremiam.

Lutei contra um impulso extraordinário de conceder-lhe o que pedia. Tudo em meu íntimo queria dizer: "Está bem, vamos esquecer tudo isto e dar o fora daqui." Por um momento breve, eterno, considerei seqüestrar as minhas próprias filhas, agarrar a minha esposa e escapar a essas horrendas patas do progresso, e viver para sempre nos Himalaias.

Mas eu sabia que não podia. Sabia que era chegada a hora. Sabia que era certo. E sabia que ela estaria bem. Mas jamais pensei que seria tão duro dizer:

- Benzinha, você ficará bem. Venha, eu a carregarei.

E ela ficou. Um passo para dentro da classe e o gato da curiosidade apoderou-se dela. Eu me afastei. Entreguei-a. Não muito. E não tanto quanto terei de fazer no futuro. Mas entreguei-a tanto quanto pude hoje.

Enquanto eu caminhava de volta ao carro, um versículo apoderou-se de mim. Era uma passagem que eu havia estudado antes. Os acontecimentos de hoje transpuseram-na da teologia branca e preta para a realidade colorida.

"Que diremos, pois, a estas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho poupou, antes o entregou por todos nós, como não nos dará também com ele todas as coisas?" (Romanos 8:31,32).

Foi assim que Deus se sentiu? O que eu senti hoje de manhã é de alguma forma parecido com o que o Senhor sentiu quando entregou seu Filho?

Se foi, isso explica muita coisa. Explica a proclamação dos anjos aos pastores nas cercanias de Belém. (Um pai orgulhoso anunciava o nascimento de um filho.)

Explica a voz no batismo de Jesus: "Este é meu filho... " (O Senhor fez o que eu queria fazer mas não pude.)

Explica a transfiguração de Moisés e Elias no alto do monte. (O Senhor os enviou para encorajá-lo.)

E explica como o seu coração deve ter doído quando ouviu a voz entrecortada de seu filho: "Pai, passa de mim este cálice."

Eu estava soltando Jenna dentro de um ambiente seguro com uma professora compassiva e pronta para enxugar quaisquer lágrimas. Mas o Senhor soltou Jesus em uma arena hostil com um soldado cruel que transformou as costas do seu Filho em carne viva.

Eu me despedi de Jenna sabendo que ela faria amizades, riria, desenharia figuras. O Senhor despediu-se de Jesus sabendo que cuspiriam nele, caçoariam dele e o matariam.

Entreguei minha filha plenamente ciente de que se ela precisasse de mim, eu estaria ao seu lado num instante. O Senhor despediu-se de seu Filho plenamente ciente de que quando ele mais precisasse do Pai, quando seu brado de desespero rugisse pelos céus, o Pai ficaria em silêncio. Os anjos, embora em posição de alerta máximo, não receberiam nenhuma ordem sua. Seu Filho, embora em angústia, não sentiria nenhum conforto vindo das mãos do Pai. "Ele deu o melhor que tinha", raciocina Paulo. "Por que duvidaríamos do seu amor?"

Antes que o dia terminasse, sentei-me em silêncio uma segunda vez. Desta vez, porém, não ao lado de minha filha, mas diante do meu Pai. Desta vez, não triste por causa do que eu tinha de dar, mas grato por aquilo que já havia recebido - a prova viva de que Deus se importa.

1. "Sunrise, Sunset" (Jerry Bock, Sheldon Harnick), direitos autorais 1964 - Alley Music Corp. e Trio Music Co. Inc. Todos os direitos reservados. Usado com permissão.

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